A reinvenção da HP nos portáteis

Em novembro de 2014 a Hewlett-Packard anunciava mais um computador portátil. Mas este não era como os outros. Aliás, aquele nem parecia ser um portátil da marca que o anunciava. Recebeu a denominação de Omen e era uma máquina de gaming. Mesmo dentro do segmento dos computadores dedicados para videojogos, onde existem as criações mais extravagantes, este portátil conseguia ser fora do normal.

Tudo naquele portátil transpirava linguagem alienígena. Meses mais tarde vi-o pela primeira vez num retalhista português e na altura a atenção dividiu-se. Primeiro para a dobradiça metálica com tons azulados e laranjas, como se tivesse sido queimada de forma decorativa. Depois o sistema de retroiluminação que estendia-se até ao sistema de som e pulsava ao ritmo da música. O ecrã de grande qualidade. O pontilhado na tampa do portátil e o toque do metal em preto mate.



É fácil recordar o HP Omen. É um portátil que mesmo hoje tem poucos concorrentes dignos na conjugação de beleza, material de construção e também no desempenho – ainda que passados dois anos as especificações sejam agora mais modestas e o portátil não suporte, por exemplo, experiências de realidade virtual.

Pouco tempo depois tive a oportunidade de passar duas semanas com o equipamento para testes e no final era difícil de acreditar: foi mesmo a HP quem fez isto? Gabei-lhes a audácia e a vontade de quererem fazer diferente.

Mal sabia que esse era apenas um de vários momentos de viragem que a HP estava a preparar. Mudança essa que culminou recentemente com o anúncio do Spectre 13, o portátil mais fino do mundo, mas que uma vez mais voltou a fazer ‘parar’ a imprensa especializada devido ao seu aspeto arrojado.

“Acho que a HP há cerca de dois anos compreendeu muito bem quais eram as tendências que iriam consolidar a curto e a médio prazo. Acho que compreendeu sobretudo questões como a crescente exigência na parte do entretenimento, a crescente exigência na parte de ter a tecnologia mais recente e facilmente acessível”, explicou o gestor da área de computação pessoal da HP Portugal, Pedro Coelho, em entrevista ao FUTURE BEHIND.

“Nós ouvimos os nossos clientes. Naturalmente também continuamos a estudar o mercado. Mas o que nós percebemos foi uma tendência para o que é esteticamente apelativo, uma tendência para o que é móvel. No fundo para estes millennials que têm novos padrões de utilização do seu equipamento e percebemos que isso implicava também mudar do nosso lado as propostas que trazíamos para o mercado”, acrescentou o executivo para depois dizer:

“Deixámos de nos acomodar ao que eram os segmentos padrão e fomos aos extremos”.

Um dos objetivos da marca agora passa pela tentativa de “sedução” dos clientes. “Esse é um posicionamento muito diferente do que teríamos há dois anos”, defendeu Pedro Coelho.

HP Spectre 13, a jóia da coroa

Não precisa de estar incrustado com diamantes ou ser construído em platina para que a palavra ‘luxo’ lhe assente bastante bem.

As imagens explicam apenas parte da escolha. Pedro Coelho deu-nos o que faltava.

“Fomos buscar referências de design a diferentes partes do mundo e a diferentes mercados. Vamos buscar elementos ao design de automóveis e ao design da decoração doméstica. As dobradiças douradas vêm do facto de termos encontrado o cobre como a liga metálica que aparecia em muitos acessórios domésticos premium e que eram usados para fazer pequenos acabamentos”, detalhou.

É difícil ficar indiferente ao Spectre 13. Mesmo que não goste da construção em fibra de carbono e alumínio ou dos tons prateado e cobreado escolhidos para o portátil, será mais difícil virar a cara ao feito tecnológico que a gigante norte-americana atingiu.

Criou um portátil com uma espessura de 10,4 milímetros e que inclui processadores Core i5 ou i7, os mais potentes da Intel para portáteis, 8GB de RAM e um armazenamento interno que pode ir até aos 512GB em SSD.

A HP é atualmente a segunda marca que mais computadores vende a nível mundial, apenas superada pela Lenovo

Compactar todos estes elementos num chassis bastante reduzido traz desafios na área do arrefecimento, mas esses foram ultrapassados com a ajuda de um sistema de hiperbárico, isto é, a forma como as ventoinhas, as condutas de ventilação e as saídas de ar estão projetadas cria um espaço pressurizado que permite uma melhor circulação do ar dentro da máquina.

Mas atenção que toda esta beleza, potência em mobilidade e qualidade de construção tem um preço elevado: 1.999 euros para a versão mais avançada do Spectre 13.

“É um portátil onde a HP pôs tudo aquilo que achava que devia de ter para ser o melhor portátil do mundo, mais fino, com melhor performance, colunas Bang e Olufsen e design extremamente apelativo. Sabemos que há pessoas que querem o melhor e há pessoas dispostas a pagar pelo melhor. Este portátil é para essas pessoas”, defendeu o gestor de marketing da HP Portugal, Alexandre Silveira.

Mas de todos os elementos do portátil aquele que mais grita ‘reinvenção’ é o logótipo. Não são as típicas letras H e P bem delineadas, são barras laminadas e colocadas de forma intencional para criar uma ilusão ótica que nos devolve a sigla HP.

Será este o logótipo que marcará presença nos equipamentos das linhas Envy e Spectre daqui para a frente. E nada dirá melhor que a HP está mesmo em fase de mudança.

Como conta o The Verge, o desenvolvimento deste novo logótipo começou no ano de 2008 e a agência responsável, a Moving Brands, teve de passar por um processo de grande burocracia para receber a aprovação para o novo logo. O trabalho foi evoluindo até 2011 e na altura tudo estava preparado para trazer a nova imagem para todos os segmentos onde a empresa atuava.

Uma fase mais conturbada da HP na sua gestão de topo e que ficou marcada pela saída de três diretores executivos acabou por ditar um cancelamento do rebranding. O novo logo foi para a gaveta e só de lá saiu recentemente.

A HP trouxe alguma nova vida ao trabalho desenvolvido em 2011 pela Moving Brands, como o facto de as linhas verticais estarem inclinadas a 20º e não a 13º como inicialmente era suposto. Mais grau, menos grau, é uma adição bem-vinda e que a HP pode explorar para transmitir um aspeto de marca mais moderna, dinâmica e futurista.

Vai ajudar a completar a transformação que a marca já tem sentido no mercado nacional. “Os consumidores reconhecem que além da qualidade de construção que está no ADN da HP, agora trazemos mais valor com a questão do design. Estamos mais contemporâneos, estamos mais alinhados com as exigências dos dias atuais e temos vindo a subir na escala de preços”, atirou Pedro Coelho.

Mas esta não é a única marca nova que a HP está a trazer para o mercado.

A Voodoo está-lhes no sangue

Em 2006 a HP comprou a empresa de computadores dedicados para videojogos Voodoo. Mas a verdade é que tal como o logótipo, a equipa e a suas ideias acabaram por ser ‘engolidas’ na máquina gigantesca que era a HP e pouco se viu desta aquisição. Em 2007 foi lançado o portátil Blackbird 002 e no ano seguinte chegou ao mercado o Voodoo Envy, um portátil de gaming que era uma mistura de velhos e novos conceitos, mas pouco tempo depois já havia quem perguntasse pelo computador.

Felizmente a Voodoo não desapareceu, esteve adormecida. O HP Omen de 2014 foi o acordar da equipa Voodoo e em 2016 esse ADN está com uma presença muito mais forte.

Parte do novo alinhamento de computadores que a HP está a trazer para o mercado português passa pelos portáteis de gaming, mas também haverá desktops. Durante muito tempo a marca estive ‘desaparecida em combate’ neste segmento, apresentando-se agora ao serviço. E atenção: os portáteis da HP de gaming serão conhecidos como Omen by HP.

É na área do gaming que a HP Portugal tem maiores ambições ao nível de divulgação da nova marca.

“Queremos estar associados a equipas de gaming. Já estamos associados lá fora a equipas de gaming, uma equipa de League of Legends e outra de Counter Strike. Em Portugal estamos a trabalhar para também estar associados a equipas e torneios. Queremos estar nos principais eventos de gaming de Portugal. Queremos gerir isto de forma diferente, criar aqui mais uma perspetiva de comunidade, os gamers têm muitas especificidades que o distinguem do consumidor tradicional”, revela Alexandre Silveira.

A luta da HP no mercado do gaming vai agora ser muito mais difícil, com ou sem marca nova. É que uma ausência tão prolongada fez com que marcas como Asus ROG ou Acer Predator fossem ganhando espaço.

 

“Não esperamos estar a disputar a liderança do segmento de gaming em Portugal no próximo ano. Este é um trabalho que se vai construir, estivemos longe do segmento durante muitos anos. Agora reentramos e portanto queremos ver os frutos o mais depressa possível, mas temos consciência que temos de fazer o nosso caminho e teremos de ter paciência. Não é algo que se consiga de um dia para o outro”, defendeu o responsável de marketing.

Se por um lado o caminho parece espinhoso, é ao mesmo tempo uma rota cheia de novas oportunidades. “O mercado de gaming também se está a redefinir. Existem novas exigências com a questão da realidade virtual. Não só da parte dos jogos, de todos os acessórios e consequentemente da exigência adicional que há sobre o hardware, para suportar estas funcionalidades de realidade virtual. Isto sugere que tem de haver uma nova oferta, não é a oferta do passado que se coaduna com as exigências que existem e com a apetência que existe para a realidade virtual”, concluiu Pedro Coelho.

A Força esteve com eles

A mudança de posicionamento da HP, esta transformação que tem vivido, vai além de computadores premium e de gaming. Vai também até ao coração dos nichos. No Natal passado a tecnológica norte-americana foi a marca que conseguiu a licença para produzir portáteis alusivos ao tema Star Wars.

O propósito foi a estreia do sétimo capítulo principal da saga cinematográfica, possivelmente o filme mais falado do ano.

A parceria com a marca Star Wars estendeu-se também à área dos conteúdos e dos periféricos para computador

“A questão do Star Wars foi um modelo que nós lançamos não pelo volume, mas pelos ganhos de imagem e de associação ao Star Wars que isso trazia. Nesse aspeto que foi o principal balanço que fizemos, foi um sucesso pois a campanha que fizemos envolvendo figuras públicas, bloguers, envolvendo uma série de atividades, presença em centros comerciais e publicidade nos cinemas. Trouxe um nível de atenção brutal para a HP”, explica Alexandre Silveira.

“Toda a gente falava do Star Wars no último Natal. E isso capitalizou muito para a nossa marca e conseguiu criar aqui uma afinidade com um público mais jovem, onde também precisamos de ter uma presença forte. Desse aspeto foi muito positivo”.

A criação de portáteis em modelo edições especiais, um pouco como acontece com as consolas de videojogos, mostra mais um passo que a marca decidiu dar para chegar onde não esteve nos últimos anos. Ainda que apenas alguns consumidores tenham trocado o seu antigo portátil por um HP com um traço de Kylo Ren, a verdade é que muitos outros ficaram com uma imagem diferente da marca.

Imagem parece ser de facto a palavra-chave da HP neste momento. Imagem é diferente de aparência. A questão da imagem está associada a diferentes formas de análise: fiabilidade, beleza, desempenho, valor da proposta, frescura da marca, sensação de evolução, caminho para o futuro.

A separação das águas

Seja com o HP laminado ou sob a insígnia Omen, estes são tempos de mudança para a HP nos portáteis. A divisão da HP em duas empresas – uma mais focada no consumo, outra no segmento empresarial – trouxe, pelo menos à parte de consumo, uma maior agilidade.

“Permitiu-nos estarmos mais focados no que era naturalmente o nosso investimento em investigação e desenvolvimento na área de computação. E o resultado disso viu-se poucos meses depois com o aparecimento destes produtos. Apareceram vários produtos num curto período de tempo, ou seja, significa que de facto houve um grande enfoque”, defendeu Pedro Coelho, para depois acrescentar:

“Estou cá há 12 anos e diria que na última década não me lembro de termos sido tão ágeis no time to market quanto fomos nos últimos meses. Acho que sim, que a divisão foi positiva, era exatamente isso que se pretendia”.



Claro que a HP não é a única marca que está a mexer-se no sentido da renovação e da inovação. A Acer revelou recentemente uma maior aposta no mercado do gaming e computadores da linha Predator extremamente ambiciosos. A Asus tem possivelmente um dos computadores mais loucos da atualidade, o ROG GX 700 com sistema de refrigeração liquido. A Lenovo tem-se saído muito bem com as suas propostas híbridas como o Yoga 3 Pro. E até marcas com menos tradição, como a Razer, têm espreitado oportunidades e mostrado caminhos a seguir com o Blade Stealth, um portátil de gaming que usa uma doca externa para ‘puxar’ o processamento gráfico.

Há muitos caminhos possíveis para o futuro do computador. Pedro Coelho está convencido que a curto prazo “o que vai vingar é a multiplicidade de chassis e os fabricantes têm de dar resposta a isso”. “A HP tem todos porque a HP não consegue dizer qual deles vai vingar”.

Esta tentativa erro tem trazido máquinas muito interessantes, pelo que só podemos aguardar pelas próximas etapas da transformação da HP.

Rui da Rocha Ferreira: Fã incondicional do Movimento 37 do AlphaGo.
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