O primeiro smartphone da Nokia é aquilo que temíamos: mais do mesmo

A marca Nokia traz consigo uma carga simbólica muito grande. Durante largos anos foi a empresa que ajudou a transformar por completo a forma como as pessoas comunicavam. Dispositivos como o Nokia 3310 são alvo de adoração na cultura online e vão ficar para sempre como ‘mitos’ da telefonia móvel.

Quando a Microsoft anunciou a aquisição da Nokia em setembro de 2013, esse já era o último sopro de vida da marca finlandesa. Todos sabiam que a Nokia nunca mais seria a mesma e que eventualmente acabaria por desaparecer. Assim foi: a marca Microsoft Lumia acabaria por tomar conta dos dispositivos.




Uma marca como a Nokia é difícil de esquecer e seria uma questão de tempo até que alguém quisesse recuperá-la. Essa marca foi a HMD Global, uma empresa finlandesa que definiu como missão dar novamente a Nokia ao mundo.

Mas o mundo mudou e mudou muito. Já aqui tínhamos dito que para a Nokia ter um regresso em grande, a empresa precisava de fazer algo especial, algo diferente e algo que pudesse vir a ter impacto nas opções de escolha dos consumidores. A HMD anunciou oficialmente o seu primeiros smartphone Nokia e o equipamento falha justamente todas estas metas.

“O Nokia 6 marca o primeiro passo na ambição da HMD em estabelecer um novo standard de design, qualidade de materiais e inovação de fabrico”, lê-se no comunicado que anuncia o dispositivo.

Olhe para o Nokia 6, tape o nome Nokia e o que é que fica? Um dispositivo Android como tantos outros. Quando olhamos para a lista de especificações este sentimento mantém-se.

O smartphone até tem um aspeto moderno e o facto de ser construído em alumínio é um ponto interessante. Mas não há nada no equipamento ou na sua descrição que desafie qualquer status que existe atualmente no segmento dos smartphones.

A nova-Nokia não precisava de reinventar o smartphone, apenas precisa de tentar diferenciar-se um pouco na sua proposta de valor.

A Nokia devia ter tentado uma abordagem diferente, uma que talvez não apostasse tanto no aspeto do hardware – a HMD dá um grande ênfase a este aspeto -, mas antes no segmento do software. Talvez a Nokia devesse ter seguido uma estratégia como a da Asus para o Zenfone AR: um dispositivo que suportasse as tecnologias móveis emergentes, como a realidade virtual e realidade aumentada. Trazer de origem um assistente digital, como uma Alexa ou um Google Assistant, teria sido também uma aposta interessante.

Mas não. Temos um smartphone relativamente modesto, relativamente simples.

O Nokia 6 vai estar exclusivamente acessível na China e vai ficar disponível ainda no primeiro trimestre de 2016. Vai custar 1.699 yuans, o equivalente a 233 euros. Não é um mau preço para um dispositivo com as características técnicas que apresenta, mas já há muitos smartphones com uma relação qualidade-preço interessante. Basta olhar para o Honor 6X para percebermos que o Nokia 6 vai ter dificuldade em provocar impacto.

Era importante para a recuperação da marca Nokia que este primeiro lançamento fosse pomposo e tivesse impacto. Que chamasse a atenção do mundo e que tentasse apelar aos consumidores que um dia já tiveram um telemóvel Nokia na mão.

Em vez disso a HMD preferiu ir para um dos mais competitivos mercados de smartphones do mundo, a China, como a própria empresa refere em comunicado. A China é a casa da Xiaomi, da Huawei, da Oppo, da OnePlus e de muitos outros fabricantes de marca branca que por lá fazem vida. Mesmo para o mercado chinês, que valor acrescentado traz este Nokia?

É provável que a HMD esteja a reservar uma posição no Mobile World Congress para lançar equipamentos que estejam direcionados para o mercado ocidental. Mas no Mobile World Congress, uma vez mais, a nova-Nokia terá de tentar ser especial para captar a atenção, caso contrário pode acabar por ser abafada pelos grandes lançamentos que costumam ter lugar na feira.

Rui da Rocha Ferreira: Fã incondicional do Movimento 37 do AlphaGo.
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