Durante anos a tecnológica norte-americana tem criado hardware de diferentes segmentos e até uma pessoa menos versada em tecnologia conseguia perceber que aqueles esforços não eram coordenados entre si. Smartphones, tablets, portáteis, routers, óculos de realidade aumentada, óculos de realidade virtual. A Google tem tentado de tudo um pouco, mas parece que só agora é que vai querer dar sentido à sua estratégia.
Rick Osterloh é daqui para a frente o lorde do hardware na Google. O antigo executivo da Motorola tinha deixado a Lenovo há um mês e volta à Google depois de lá ter passado como CEO da fabricante de smartphones.
Segundo a publicação Re/Code o grande desafio de Osterloh será o de unificar a disparidade de aventuras que a Google tem no segmento do hardware.
Atualmente a Google tem algum hardware que é desenhado fora de casa, como são os smartphones da linha Nexus, mas também já colocou a mão na massa com o desenvolvimento de equipamentos como é caso o Chromebook Pixel.
Além de não ter uma linguagem de design unificada entre os equipamentos, estes acabam também por estar mais associados aos produtos Google do que à marca da empresa em si como um nome de hardware. Quando pensamos num portátil Chromebook pensamos acima de tudo no sistema operativo Chrome OS e não na Google como uma empresa de portáteis.
Se olhar bem para o diagrama acima vai reparar que não consta lá qualquer produto da Nest, aquela que é a subsidiária da Google mais ligada ao hardware. O porquê de a Nest ficar independente ainda não é certo, mas pode estar relacionado com os problemas que têm havido na subsidiária liderada por Tony Fadell.
Nesta mini-novela há ainda a considerar que até aqui era a Nest que tinha a supervisão dos Google Glass, mas perde essa tarefa para o novo responsável de hardware e respetiva equipa.
A entrada de Rick Osterloh também não é inocente no timing: recentemente a líder da divisão do laboratório de hardware da Google (ATAP), Regina Dugan, saiu e juntou-se ao Facebook. A gigante dos motores de busca aproveitou assim a deixa e tenta arrumar o seu ‘quarto dos brinquedos’ de vez.
Aprender com a Microsoft
Existem vários exemplos no mercado que mostram quando há uma integração nativa entre hardware e software os resultados podem ser de grande qualidade. O iPhone é um exemplo. Os relógios da Pebble outro. Qualquer consola de videojogos também o é.
A mais recente empresa a ir atrás desta permissa de construir tudo de raiz foi a Microsoft. E sabe que mais? Está a dar-se significativamente bem nessa sua nova aventura.
O tablet Surface até teve um início de vida complicado, mas agora é um dos grandes êxitos da Microsoft. No primeiro trimestre deste ano a tecnológica faturou 1,1 mil milhões de dólares com os seus tablets híbridos, um crescimento superior a 60% numa comparação anual.
O Surface Book, o primeiro portátil de sempre da Microsoft, foi apresentado no ano passado e gerou uma grande onda de entusiasmo devido ao apelo diferenciador do hardware. Os HoloLens foram pelo mesmo caminho e são neste momento um dos gadgets mais exclusivos e inovadores que a tecnologia tem para oferecer.
Com esta aposta no hardware a Microsoft não só aumentou receitas, como estabeleceu padrões para os concorrentes. Quantos ‘clones’ do Surface já surgiram entretanto? Mais de uma dezena de diferentes marcas. Melhor: sacudiu alguma pressão por parte dos consumidores de que já não era inovadora e recuperou parte da sua imagem ‘cool’.
A Google poderá beneficiar exatamente no mesmo sentido. É uma empresa que tem recursos mais do que suficientes para tentar uma aposta mais séria no campo do hardware. Por outro lado a tecnológica de Mountain View não tem tantos anos de experiência a lidar com fabricantes de equipamentos como a Microsoft tinha.
Um outro aspeto que a empresa responsável por produtos como o Gmail, Chrome, Android, Drive, Maps e YouTube terá de saber enfrentar – e muito para aprender – é ao nível da distribuição. A Google não tem lojas e até já viu a venda do Chromecast ser barrada na Amazon, um dos maiores retalhistas online do mundo. Se vai criar hardware será também para vendê-lo pois os investidores não toleram muito bem as aventuras que não trazem retorno. A empresa-mãe da Google, a Alphabet, sabe-o muito bem.
A Google já tem algum do melhor software do mundo. Só precisa de construir hardware à altura.
Carta na manga
Já dissemos e mostrámos aqui as categorias de produto que Rick Osterloh vai orientar. A grande questão é: vai aproveitar esta nova formatação para desenvolver um novo gadget? Por exemplo, a Google não tem um smartwatch de marca própria e ao deixar o Android Wear por mãos alheias o apelo pelo sistema operativo não tem sido dos mais fortes. Aliás, a categoria ainda não está a ter tanto impacto como alguns esperavam: no ano de 2015 venderam-se pouco mais de 17 milhões de unidades de relógios inteligentes.
Mas há mais a considerar. Já surgiram vários rumores a dizerem que a Google quer ficar mais séria no segmento da realidade virtual e que para isso poderá estar a preparar dois gadgets: um mais acessível e visto como uma evolução do projeto Cardboard; e um outro equipamento mais potente e que nem sequer necessitaria de estar ligado a um computador por ter ‘a bordo’ todos os componentes.
Rick Osterloh foi um dos homens que ajudou a Motorola a tornar-se novamente numa marca apelativa depois de um quase desaparecimento, sobretudo no mercado europeu. Possivelmente não terá tempo para tal, mas talvez no dia 18 de maio, quando começar o Google I/O, já possamos ver algum trabalho conduzido pela batuta de Osterloh.