Cascais não é só uma vila bonita, cheia de turistas, com paisagens convidativas e bastantes locais que apelam a uma paragem de contemplação. Cascais é um dos municípios que mais tem investido em novas tecnologias com o objetivo de tornar a gestão da cidade mais inteligente – o que por sua vez resulta em melhores condições de vida para os que lá habitam e passeiam, como resulta também em dinheiro poupado que pode ser canalizado para outras atividades.
Bem pode procurar pelas ruas de Cascais que dificilmente vai reparar neste lado smart da vila. A ideia acaba por ser um pouco esta: o objetivo não é que se veja, mas que se sinta e se viva. São vários os projetos de cariz tecnológico que já estão em funcionamento e é intenção que este programa de apoio tecnológico continue a ser expandido.
“A prioridade para Cascais são os cidadãos e se a tecnologia vier resolver os problemas dos cidadãos e vier dar melhor qualidade de vida, então a tecnologia é uma prioridade para Cascais. Nós entendemos a tecnologia como um fim em si mesmo, não somos viciados em gadgets. Gostamos de gadgets, mas os gadgets ou a tecnologia que resolvem problemas dos cidadãos. É esse o nosso posicionamento e daí não fugimos”, disse o vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais, Miguel Pinto Luz, em declarações à imprensa no final da apresentação da 5ª edição do concurso de empreendedorismo Vodafone Big Smart Cities.
Um dos melhores exemplos que Cascais tem para apresentar é o que está a ser aplicado ao nível da rede de gestão e recolha de resíduos. A Cascais Ambiente, marca da empresa municipal que está responsável por esta área, está a injetar tecnologia em diferentes vectores deste segmento.
Pelo município já estão espalhados 400 sensores que ajudam a determinar o estado de preenchimento dos contentores do lixo. Se os contentores estiverem ainda muito vazios, então essa localização pode ser cortada da rota de recolha, o que ajuda a diminuir o número de quilómetros percorridos pelas equipas de recolha.
Estes sensores, que custam entre 100 a 200 euros, estão atualmente a funcionar em tecnologia 3G, mas o porta-voz da Cascais Ambiente, Luís Almeida Capão, revelou que os testes com tecnologia Sigfox aplicada a estes sensores já estão no roteiro da empresa municipal.
Além dos sensores digitais de enchimento, existem ainda sistemas de sinalética visual que estão aplicados a outros contentores e que também permitem às equipas perceber se estes pontos devem ser colocados nas suas próximas rondas ou não.
Luís Almeida Capão falou ainda na existência de um sistema nos camiões de recolha que permite assinalar geograficamente o abandono de eletrodomésticos, móveis de grande dimensão ou até resíduos verdes. Sempre que um elemento for avistado e não puder ser transportado no momento, é comunicado de forma automática para o sistema, com a localização exata, para que no dia seguinte possa ser feita a recolha.
Mais do que as tecnologias em si, são talvez os números a parte mais importante. A Cascais Ambiente conseguiu reduzir 180 mil quilómetros nas suas rotas anuais, o que representa uma redução de 20% relativamente aos percursos totais que faziam até à integração destes sistemas inteligentes.
Estas reduções levaram à poupança de 800 mil euros e também à redução de 350 toneladas nos níveis de emissão de CO2, detalhou Luís Almeida Capão.
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Se o projeto de gestão de lixo é um dos ‘meninos bonitos’ do município de Cascais, o sistema de mobilidade MobiCascais não fica atrás. Entre Cascais e Estoril existem 14 ilhas equipadas com um sistema inteligente para o aluguer de bicicletas. Este aluguer pode ser feito através da aplicação móvel ou através de um cartão NFC que os habitantes ou turistas podem requisitar.
Estes interfaces de interação dão depois acesso a outras modalidades de transporte. Através da aplicação MobiCascais é possível saber em que posição estão determinados autocarros e é igualmente através da app que pode ser feito o pagamento do estacionamento dentro da vila, por exemplo.
Se tanto a gestão de resíduos como a mobilidade são áreas críticas dentro de qualquer cidade, Cascais quer que o conceito de smart também possa ser aplicado em escalas mais pequenas, mas que acabam por resultar igualmente em maior eficiência e numa melhor experiência de utilização.
O Museu da Vila está equipado com um sistema de luz inteligente que adapta as condições de luminosidade das suas diferentes zonas dependendo se está alguma pessoa por perto ou não. O museu também tem um sistema de contagem automática de entradas e saídas de visitantes.
Talvez não tão comum, o museu está ainda equipado com uma tecnologia que faz um mapa térmico do museu, explicou José Lopes, o diretor de produto de IoT da Vodafone Portugal, a empresa parceira desta integração tecnológica. “Acreditamos que o IoT no geral vai ser algo muito presente nas nossas vidas, soluções simples e fáceis para aproveitar a rapidez das comunicações”, acrescentou depois.
O mapa térmico permitirá aos responsáveis do museu perceber em que zonas as pessoas permaneceram mais tempo, perceber que obras atraíram mais a atenção dos visitantes e isso por sua vez permite também uma melhor gestão do espaço e do seu espólio.
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Através de uma única aplicação os funcionários do museu conseguem ainda programar horários de funcionamento dos sistemas de iluminação, visualizar consumos e estabelecer notificações para acontecimentos específicos: no final poupa-se dinheiro, ajuda-se o meio ambiente e aumentam-se os níveis de comodidade dentro do museu.
Uma outra solução que a Vodafone está a preparar e que está destinada à rede de iluminação pública vai permitir controlar cada poste de iluminação, um a um, e de forma remota. Estas pequenas caixas que são colocadas nas luminárias podem ainda conter sensores que medem a qualidade do ar e módulos que funcionam como um hotspot. Quer internet? No futuro basta encostar-se a um poste de iluminação.
Cascais em modo alpha
Há muitas cidades em Portugal que estão a apostar em soluções tecnológicas e estão a integrar conceitos de smart cities nas suas estratégias de curto, médio e longo prazo. Guimarães, Torres Vedras, Braga, Porto, Lisboa, Viseu, Sabugueiro, Almada, Coimbra, Faro e Évora são outros exemplos de localidades que estão a usar a tecnologia para melhorar o nível de vida dos seus habitantes.
Mas mais uma vez Cascais volta a surgir em destaque. O compromisso para com as tecnologias emergentes ficou hoje ainda mais firme ao ter sido revelado que a vila vai ser o primeiro município da Rede Nacional de Cidades Experimentais. O objetivo desta rede é encontrar municípios que estejam dispostos a experimentar tecnologias em fase embrionária, dando assim a oportunidade a muitos novos projetos, startups e projetos pilotos de provarem o seu valor no ‘mundo real’.
“A rede nacional de cidades experimentais nasce de uma necessidade que nós tivemos nas anteriores edições [Big Smart Cities] em que, de facto, as startups queriam começar a testar em ambiente real e não conseguiam, porque os interfaces com as câmaras não são fáceis – com quem falar, por onde andar? Depois as câmaras não se podem arriscar a fazer teste em ambiente real com tecnologias que estão numa fase ainda muito embrionária. Então nasceu essa necessidade e nós olhamos para isso”, explicou o professor assistente da Nova School of Business and Economics, Miguel Muñoz Duarte, no evento de apresentação do Big Smart Cities.
O concurso Big Smart Cities já ajudou a transformar 20 ideias em empresas, que em conjunto já captaram um total de 5 milhões de euros em investimento e criaram 110 empregos
Miguel Muñoz Duarte quer que esta rede seja um ponto de encontro entre empreendedores com ideias e cidades com necessidades por colmatar. O professor adiantou que já existem vários municípios interessados em fazer parte desta rede de cidades experimentais, mas também já deixou o aviso de que será necessário garantir condições mínimas para fazer parte desta rede, não basta querer.
“Posso dizer que na teoria há muitos municípios interessados, na prática é relativamente diferente. Há uma série de condições que são necessárias como, por exemplo, ter um interface [de ligação e contacto]. Qual é o gabinete que apoia, a startup vai bater à porta de quem? Vai haver alguma parte financeira também, porque muitas vezes queremos testar, mas sem recursos financeiros é difícil”, revelou, escusando-se no entanto a revelar pontos concretos até ao dia 11 de julho.
Já o vice-presidente da Câmara Municipal de Cascais, Miguel Pinto Luz, acredita que esta plataforma será um ponto importante para a troca de experiências entre cidades no que diz respeito ao tema das smart cities.
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“Nós temos muitas parcerias e nós entendemos que com o Big Smart Cities, com estas cinco cidades que estão associadas, que todas as outras poderão beber destes empreendedores e vimos aqui alguns com ideias que nós próprios dissemos imediatamente que iríamos adotar, testar ou tentar testar e que podem ser replicadas para outros municípios”.
À medida que a iniciativa vá ganhando maior adesão, espera-se também que comece a ganhar um maior foco. Pela sua tipologia, Cascais é um município que vai dar destaque a soluções na área do turismo e da educação.
“Nós não temos uma perspetiva maniqueísta da vida, nem dos concelhos serem estanques e fechados, não. Aquilo que são boas práticas hoje em Cascais podem amanhã ser aplicadas em Lisboa e no Porto, mas queremos que o mesmo que aconteça lá se possa fazer aqui”, concluiu Miguel Pinto Luz.
“Gostamos de experimentar, experimentar, experimentar. A todos os que vierem a ganhar o concurso, convidamos a experimentarem a vossa tecnologia neste território. Não é muito pequeno, não é demasiado grande, é muito fácil a tomada de decisão. Trabalharão de facto com o executivo municipal”, reforçou ainda durante a apresentação.
As primeiras ideias a serem colocadas à prova neste ambiente de cidade experimental vão sair da 5ª edição do Vodafone Big Smart Cities: os três primeiros classificados e as menções honrosas terão acesso a condições para que os seus projetos tenham o primeiro teste real no município de Cascais.