Desafiar as leis do mercado da impressão 3D com a Blocks Zero

Fomos ao mercado de São Domingos de Benfica, em Lisboa, mas não foi para comprar fruta. Fomos à procura de uma mini-impressora 3D, mais concretamente da Blocks Zero. Estamos de olho nela desde a Maker Faire. Num dos espaços contíguos ao mercado está sediada a Blocks, uma empresa portuguesa que produz impressoras 3D.

Agora são seis os elementos da Blocks e estão num espaço próprio que lhes permite produzir, embalar e expedir as impressoras 3D, assim como realizar projetos de desenvolvimento e prototipagem para outras empresas. Mas nem sempre foi assim.




Há menos de dois anos eram apenas três os elementos: Duarte Vasconcelos, Alexandre Guerreiro e Tiago Rocha, os fundadores. Em janeiro de 2015 tão pouco tinham uma sede, trabalhavam a partir da casa de Alexandre. Dinheiro? Também não abonava muito, foi preciso meter mãos à obra para ganhar alguma tração.

“A única hipótese que tínhamos para entrar no mercado era termos um produto estupidamente bom, estupidamente acessível. Lançámos a pré-venda da Blocks One que dentro dos meios que nós tínhamos e pessoas que conhecíamos, conseguimos vender logo três, o que nos financiou para fazer mais três. Depois ao vender aquelas três conseguimos vender mais dez. E ao vender dez comprámos material para mais 20. Este mês [novembro de 2016] vendemos nove impressoras. Só este mês”.

A explicação é de Duarte Vasconcelos, o atual diretor executivo da Blocks. Foi também por causa de uma situação vivida por Duarte que o projeto acabou por arrancar.

“Isto tudo começou porque comprei uma impressora para um outro projeto e estava completamente descontente. Dei-me muito bem com o Alexandre, ajudou-me imenso a tentar pôr a impressora a funcionar, que era uma Prusa, a mais simples de todas, mas estava a dar em maluco com aquilo, literalmente. Depois em conversa ele disse-me ‘Olha, tenho uma ideia para fazer uma impressora, tenho alguns protótipos com mais um amigo meu”.

A Blocks tem uma linha de produção feita com Blocks One. A empresa também faz serviços de prototipagem. #Crédito: Future Behind

Foi assim que nasceu a Blocks One, o primeiro modelo desenvolvido pela empresa. Em termos de características é uma impressora 3D semelhante a tantas outras, mas acaba por destacar-se pela relação qualidade-preço que apresenta. Enquanto uma Ultimaker 2, por exemplo, custa perto de 1.800 euros, a Blocks One custa 750 euros.

“Tem muito a ver com engenharia, com saber exatamente aquilo que se quer fazer”, disse Duarte Vasconcelos sobre a fórmula que a Blocks encontrou para conseguir produzir impressoras mais baratas. Depois foi Alexandre Guerreiro quem explicou melhor o ‘segredo’.

A Blocks já vendeu perto de 150 impressoras e 95% do mercado é português

“Acho que isso também assenta muito por causa da impressão 3D e do nosso modelo de negócios. Geralmente tu quando tens métodos de produção industriais isso implica escalar, implica ter volume, implica correr mais riscos, fazer moldes, fazer investimentos mais elevados. O aparecimento da impressão 3D permitiu-nos criar as nossas peças, com designs muito mais arrojados”.

“Claro que no futuro pretendemos escalar e chegar a uma produção mais industrial e se calhar ter de correr esses riscos que na altura eram um pouco impensáveis com a nossa estrutura económica. A impressão 3D ajudou-nos a fazer mais impressão 3D. Sem dúvida. Sem dúvida!”, concluiu Alexandre.

Uma nova peça na visão da empresa

A Blocks tem uma visão muito definida sobre o mercado da impressão 3D, sobretudo do lado da construção de hardware.

“A nossa visão é agarrar e dizer ‘uma impressora 3D é uma ferramenta‘. Não é suposto ser um perito em impressão 3D. É suposto eu agarrar na impressora e imprimir a peça. O que quero é a peça, não a impressora. A impressora é a ferramenta”, explicou Duarte Vasconcelos.

O próprio Duarte, CEO da Blocks, não sabia fazer modelação quando toda esta aventura começou. Dedicou algum do seu tempo a tutoriais online e ao fim de dez sessões já sabia trabalhar com software de criação de objetos a três dimensões.

Se a ideia é transformar a impressora 3D numa ferramenta, então a empresa precisava de explorar um segmento diferente.

“Os 750 euros não é um valor de gadget, ou pode ser, mas para pessoas com um poder de compra muito grande, mas não é a maioria das pessoas. Havia aqui algo que era preciso tratar que não fosse o kit chinês, porque o kit chinês vai dar problemas. E é feio, as pessoas não querem”.

“Havia aqui uma lacuna que era preciso colmatar. Quero ter uma peça, quero conseguir imprimir, quero ter uma ferramenta para imprimir, mas não estou disposto a gastar 750 euros porque na verdade é um gadget, é uma brincadeira que quero fazer, não é algo profissional ou semiprofissional”.

Foi neste sentido que nasceu a Blocks Zero. A impressora destaca-se claramente pelo tamanho compacto. Tão compacto que dá para fazer isto.

Da esquerda para a direita: Nuno Antunes, gestor de produto; Duarte Vasconcelos, diretor executivo; Alexandre Guerreiro, diretor tecnológico. #Crédito: Future Behind

E sim, se está a pensar que um tamanho mais pequeno significa um preço igualmente mais pequeno, acertou. A Blocks Zero vai ser vendida no próximo ano por um preço de 350 euros. Mas atualmente é possível conseguir a impressora 3D por muito menos.

A Blocks está a organizar uma campanha de financiamento colaborativo no Indiegogo. Procura 50 mil euros – já angariou quatro mil – para acelerar o desenvolvimento do projeto. No Indiegogo a Blocks Zero já foi vendida a 199 euros, mas as unidades para early birds a este preço ‘voaram’. Ainda assim todos os modelos serão mais baratos do que aqueles que posteriormente vão ser colocados à venda.

A Blocks mantém todo o capital da empresa, não tendo ainda recebido qualquer investimento externo

“Havia aqui de facto uma lacuna e nós achámos que com 350 euros conseguimos dar às pessoas uma impressora com umas dimensões um bocadinho mais reduzidas da Blocks One, mas que ao mesmo tempo consegue ter uma qualidade, não digo igual, mas quase igual à Blocks One. Está ali muito, muito perto”, disse Duarte Vasconcelos.

A campanha no Indiegogo acaba no entanto por ter mais objetivos. A Blocks pretende perceber com esta ação se a Blocks Zero desperta interesse no mercado internacional, funcionando como o primeiro passo da startup portuguesa a nível de internacionalização deste e de outros produtos.

“Isto expõe-nos logo ao mercado mundial e aparentemente está a correr bem. Obviamente que temos quatro dias de campanha e não posso estar aqui com grandes ilações”, resfriou de seguida o CEO.

“Aqui nós apostamos num compromisso qualidade-preço. Não quero dar o mais barato porque o mais barato não vai funcionar e isso vai ferir a tua suscetibilidade. Compraste uma máquina para imprimir e sai-te um chouriço. E tu não queres um chouriço. É sempre um compromisso, não vamos para o mais baixo, vamos para o mais baixo dentro da qualidade que é aceitável”.

A equipa ainda está a trabalhar em pormenores relativos à campanha de crowdfunding. Um destes elementos é o manual de instruções e o empacotamento que está a ser preparado para a impressora. O objetivo é que funcione ao estilo dos móveis do Ikea, mas removendo parte da ‘confusão’.

Por exemplo, em vez de colocar os parafusos todos no mesmo saco, estão todos divididos por fases de montagem. A probabilidade de alguém usar as peças erradas no momento errado da montagem torna-se por isso muito baixa.

“A ideia era: a minha mãe tem que montar este kit. E monta”, assegura Duarte Vasconcelos.

Ao montar a impressora o utilizador estará ao mesmo tempo a garantir um conhecimento sobre o sistema que lhe permitirá no futuro fazer uma melhor manutenção do equipamento.

Calibrar o prato

A campanha de crowdfunding vai trazer uma maior visibilidade e um maior volume de negócios no curto prazo para a Blocks, mas os planos da empresa não ficam por aqui.

Além da One e da Zero, a empresa produz ainda impressoras 3D a pedido. Aqui o objetivo é responder a necessidades específicas das empresas-clientes. Há quem necessite de impressoras com três metros, por exemplo.

Apesar de ser objetivo da Blocks querer manter este conceito de feito à medida, a empresa vai procurar alinhar melhor o seu portfólio de máquinas dedicadas ao segmento empresarial. Assim vão surgir as Blocks Pro, que estarão disponíveis em três tamanhos. Ao ‘normalizarem’ parte deste processo de produção para o segmento empresarial, a Blocks consegue ao mesmo tempo reduzir o custo global das máquinas.

“Vamos desenvolver três máquinas com tamanhos crescentes, tipo matrioska, e acredito que lá para agosto, durante as férias de verão, deve estar disponível”, disse o diretor executivo.

Mesmo estando a preparar um alinhamento completo de impressoras 3D, os elementos da Blocks não acreditam muito no conceito de uma impressora 3D em cada secretária neste momento. Dizem que o mercado ainda não está educado para essa realidade. No entanto tem-se assistido a uma evolução interessante sobretudo do lado dos software de modelação que estão a ficar cada vez mais acessíveis. Basta ver os esforços que a Microsoft está a fazer neste segmento.

“Nós não queremos que as pessoas sejam génios da impressão 3D, mas que utilizem as máquinas para imprimir. O que queremos é a sensação de poder, é a sensação de ‘foi impressa uma peça, saiu, tenho uma peça na mão, criei!‘, concluiu o CEO.

Rui da Rocha Ferreira: Fã incondicional do Movimento 37 do AlphaGo.
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