Viajar no tempo é um dos conceitos mais carismáticos do domínio da ficção científica. Há algo de apelativo na ideia de podermos visitar o passado e vermos na primeira pessoa acontecimentos que definiram a humanidade ou até criaturas que já não existem, como os dinossauros. E também há quem não se importasse de espreitar o futuro para saber como vai estar tudo daqui a 20 ou 30 anos.
Com a Timelooper ainda não podemos espreitar o futuro, mas podemos dar um salto até ao passado. Passado esse que pode ser bem longínquo. A aplicação permite que os utilizadores revivam o Grande Incêndio de Londres em 1666 ou assistam na primeira pessoa à construção da Tower Bridge em 1892.
Demasiado próximo? Então que tal um salto até Ephesus, no ano de 100 A.C., quando ainda era uma cidade grega? Para ver como o tempo passa e de como o mundo muda, atualmente a localização de Ephesus faz parte da província turca de Selçuk in İzmir. Se tiver preferência por acontecimentos mais fortes, então pode simplesmente fazer uma visita à cidade de Berlim em 1989, altura em que caiu o muro que dividia a Alemanha e o mundo.
A grande questão é: como é que uma simples aplicação móvel – para Android e iOS – permite que os utilizadores viajem no tempo? A resposta é dada através de uma aposta na realidade virtual e na realidade aumentada.
A componente de realidade virtual acaba por ser o grande factor de diferenciação da Timelooper. O objetivo é que um dia que visite Londres, por exemplo, o utilizador possa reviver alguns dos acontecimentos passados que marcaram o desenvolvimento da cidade e nos quais foram edificados aqueles que são, ainda hoje, alguns dos seus monumentos mais icónicos.
Há um aspeto interessante na Timelooper e que deve desde já a ficar a conhecer: só é possível aceder às experiências de realidade virtual apenas quando está no local a que se referem. A ideia é trazer uma maior riqueza à visita e também proporcionar outro patamar de conhecimento ao turista.
Um dos cofundadores da Timelooper, Yigit Yigiter, esteve em Portugal na semana passada a propósito da conferência Tourism Innovation Competition e, em entrevista com o FUTURE BEHIND, explicou qual é a essência da sua plataforma. “A promessa da realidade virtual é levar-te aos locais que não podes visitar. A nossa promessa é levar-te até aos tempos que não podes visitar”, salientou o empreendedor.
Yigit Yigiter já pensava numa forma de dar um lado mais interativo e multimédia às visitas turísticas há mais de dez anos, numa altura em que o iPhone nem sequer era uma realidade. Os anos passaram e o desenvolvimento tecnológico acentuou-se. Um dia a sua mulher, funcionária da Google, chegou a casa com uma unidade dos Google Carboard e foi aí que Yigit começou a juntar os pontos.
“A realidade virtual é uma tecnologia muito promissora e toda a gente está a tentar encontrar as melhores utilizações para a realidade virtual. Mas o nosso ponto de começo não foi a realidade virtual. Foi do estilo: ‘Quem não gosta de viajar? Quem não gosta de conhecer sítios culturais históricos? Quem não imagina os filmes acerca desses sítios históricos?’. Por isso perguntámos como podíamos dar essa experiência quando estivesses nos locais. E um dia aproximamo-nos mais da tecnologia da realidade virtual”.
Trazer uma camada interativa ao turismo pode ser feito de muitas maneiras, mas a Timelooper optou por apostar na realidade virtual e na realidade aumentada. Estes são dois conceitos que estão muito em voga e que são identificados como duas grandes tendências tecnológicas da atualidade. Para Yigit Yigiter a escolha foi óbvia.
“As tecnologias de VR e AR são as melhores porque aquilo para o qual estás a olhar, tem de ser aquilo que estás a tentar imaginar. Em segundo lugar a realidade virtual é móvel, todos os smartphones podem ser usados para VR”.
A Timelooper já angariou dois milhões de dólares junto de investidores e está agora numa fase de expansão
O utilizador só precisa de descarregar a aplicação, iniciar a experiência quando está no local e colocar o smartphone dentro dos óculos de cartão. Assim que coloca os óculos é transportado para um ano distante – vai perceber isso facilmente pela roupa que as pessoas usavam nessa altura ou então pelo próprio enquadramento histórico.
A Timelooper está a experimentar diferentes estilos de storytelling e em Lisboa o diretor executivo da startup mostrou inclusive um novo formato: um vídeo em câmara lenta, no qual o utilizador vai percorrendo diferentes cenários que estão associados ao crash da bolsa norte-americana na fatídica Sexta-Feira Negra.
“Deve ser uma experiência para viajar no tempo e não uma apresentação de power point”, atirou Yigit a própósito da necessidade de tudo parecer natural em ambiente de realidade virtual e de a empresa optar por não colocar setas direcionais dentro da experiência.
Pelo estado ‘cru’ destas tecnologias, ainda há desafios que se levantam de forma séria na forma como as experiências são concebidas.
“Na realidade virtual um dos desafios é que quando moves a câmara, fazes com que algumas pessoas fiquem enjoadas. É o motion sickness. Aquilo que fazemos é colocar sempre a nossa câmara no centro e a promessa é que estás a ver aquilo que verias e sentirias se estivesses ali há cem, duzentos ou mil anos. Isso é muito importante em termos de storytelling”.
A Timelooper trabalha de perto com as entidades que gerem as atrações turísticas para promover essas localizações. Quando o utilizador chega à Tower of London, por exemplo, pode comprar um bilhete que dá acesso ao espaço, à experiência VR e ainda a uns óculos de realidade virtual em cartão. Depois no fim há uma divisão de receitas entre todas as partes.
Lançada há menos de um ano, a Timelooper tem recebido bom feedback dos utilizadores e dos parceiros, segundo nos contou Yigit Yigiter.
“A nossa taxa de penetração é muito alta com os parceiros com os quais estamos a trabalhar. Em termos do feedback que as pessoas têm com os conteúdos, elas adoram. A principal razão é a própria realidade virtual, ainda antes do storytelling. Muitas pessoas não sabem o que é a realidade virtual, já ouviram falar, mas não fazem ideia da experiência. A diferença entre a experiência e a expectativa é enorme. Por isso quando as pessoas colocam os óculos e mexem a cabeça ou o telemóvel, elas ficam espantadas”.
A versão em realidade aumentada é a alternativa para quem não quer usar a Timelooper em realidade virtual
Há aspetos que a Timelooper ainda está a melhorar, como a disponibilização de mais localizações e experiências na aplicação, assim como a disponibilização de conteúdos que não estão bloqueados geograficamente. Em futuras versões da Timelooper será possível aceder a um número limitado de experiências históricas, independentemente de onde estiver. Mas a maior parte dos conteúdos vai continuar a estar bloqueada geograficamente para não deturpar o conceito de experiência turística.
Este modo de funcionamento por geolocalização também foi o formato escolhido pela aplicação Rewind Cities Lisbon, um projeto desenvolvido pela Carris e pela Câmara Municipal de Lisboa que também permite aos turistas terem experiências de viagem no tempo em pontos históricos da cidade, mas neste caso através de realidade aumentada.
Ainda que o conceito possa ser semelhante, a verdade é que a execução acaba por ser muito distinta e a Timelooper leva vantagem no grau de imersão que possibilita.
No final da sua apresentação em Lisboa, Yigit Yigiter deixou no ar a possibilidade de um dia os turistas poderem não só tirar a típica fotografia com Fernando Pessoa na baixa pombalina, mas quem sabe assistir na primeira pessoa a uma conversa com o poeta português.
Perguntámos ao CEO da Timelooper se Lisboa e Portugal estavam nos planos da empresa. “Espero que sim. É por isso que estou aqui”, respondeu.