Fomos apanhados. Todos.

Ainda nem chegou oficialmente a Portugal e já é o maior fenómeno de que tenho memória com os videojogos neste país. Pokémon GO é uma aplicação para Android e iOS que convida os jogadores a saírem de casa e explorarem o mundo em busca das famosas criaturas do universo Pokémon. Eles estão em todo o lado, seja nos parques e monumentos ou nos centros comerciais, à espera de jogadores que se aproximem com o seu smartphone para os capturar. É uma adaptação da série ao mundo real, com base nos mecanismos do jogo Ingress, popular entre as comunidades mais ‘geek’ e fãs do geocaching, e talvez por isso ninguém estivesse à espera de um sucesso tão grande.

A Niantic e a The Pokémon Company planearam um lançamento faseado, tendo começado pela Austrália e Estados Unidos da América, mas isso não impediu os fãs de todo o mundo de descarregarem a aplicação por outras vias que não as lojas oficiais da Google e da Apple. O resultado são servidores sobrecarregados, lançamentos adiados e milhares de jogadores contentes na Europa embora desejem melhorias no serviço. Sim, era suposto esperar pacientemente para um lançamento suave em todo o mundo, mas para quê esperar se o mapa está cheio de pokémon, Poké Stops e ginásios à nossa espera?

A adesão é tal que até mesmo pessoas que normalmente não associamos aos videojogos já instalaram a aplicação, que agora sofre um efeito bola de neve e chega a cada vez mais curiosos. Imagine-se quando aparecer oficialmente nos tops das lojas dos smartphones! O que me surpreende não é que as pessoas tenham curiosidade em experimentar. O que me surpreende é que os curiosos tenham realmente saído de casa com a aplicação aberta, qual poké-radar, para apanhar pokémon. A quantidade de partilhas nas redes sociais, de capturas de ecrã das suas conquistas ou fotos das criaturas no mundo real através da realidade aumentada. Tudo isto é divertido, mas estou habituado a que esta diversão seja vista como uma coisa estranha.

Perto do meu local de trabalho há uma disputa diária. Passo a explicar… Cada jogador é convidado a escolher entre uma de três equipas de cores diferentes: Instinct para o amarelo, Mystic para o azul (é a melhor!) e Valor para o vermelho. A partir daí, podemos conquistar ginásios para a cor escolhida e usar os da nossa cor para treinar, ou então combater em ginásios das cores adversárias. Ao longo do dia, conforme diferentes pessoas fazem pausas e aproveitam para ir ao bar, o ginásio local vai mudando de cor. Perto de casa, a mesma coisa. Na noite passada, saí de casa com uns amigos para apanhar alguns pokémon e aproveitamos para conquistar um ginásio que ficava nas imediações. Entretanto chega um desconhecido, de telemóvel na mão, e ninguém conseguiu evitar uma risada coletiva. No caminho de regresso, um carro encosta perto de um Poké Stop e todos os passageiros olham para o telemóvel, rindo-se quando reparam que estamos na rua a fazer o mesmo. Anda tudo atrás do mesmo.

Nunca se viu nada assim. Mesmo vivendo na capital, estou em Portugal, rodeado de adultos numa ‘caça ao tesouro’ coletiva pelas ruas da cidade. Pelo meio dos festejos da vitória da Seleção Nacional no passado domingo, não faltou quem espreitasse o telemóvel à procura de um pokémon raro que pudesse também estar a festejar. No Facebook, proliferam as comunidades de Pokémon GO, por equipa ou localidade e até ambos. Crescem os posts de pessoas a combinar caminhadas e as histórias pessoais de experiências com o jogo. A imprensa sensacionalista já começou com artigos alarmistas dos ‘perigos’ da aplicação, mas convenhamos que é uma questão de bom senso ter-se atenção ao meio em redor e, obviamente, prestar especial atenção às crianças entusiasmadas com o jogo.

Seja para colecionar, conquistar ou simplesmente passar o tempo, Pokémon GO está a tirar os portugueses de casa e a fazê-los interagir, mesmo que acompanhados pelo smartphone. Não é um encontro de jogadores no Iberanime, mas uma atividade que está a chegar até a quem não liga a jogos além do Candy Crush. Há até quem já lhe chame o novo Farmville, mas a deslocação física que o jogo exige vai muito mais além. Com a desculpa de “apanhá-los todos”, Pokémon GO apanhou-nos a nós.



Telmo Couto: Engenheiro informático de profissão, sou um fã de videojogos e acompanho a indústria desde a adolescência, ainda no tempo das revistas. Escrevo regularmente para o Meus Jogos, onde há 6 anos lidero uma equipa de críticos amadores.
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