Para quem tinha pouca experiência na criação de hardware e nenhuma experiência na criação de computadores, a Microsoft está a fazer um trabalho dos diabos com a sua linha de equipamentos Surface. São bonitos, são bem construídos, são apelativos e são equipamentos que provocam um sentimento de desejo nos consumidores.
Além do trabalho feito em termos de hardware, é também de louvar a resiliência e a forma como a Microsoft evoluiu os seus equipamentos. O Surface original não foi de todo bem recebido e teve um impacto de 853 milhões de dólares nas contas da empresa.
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Perante um prejuízo deste tamanho logo à primeira tentativa, teriam sido muitas as empresas que optariam por escavar um buraco para enterrar este empreendimento.
A Microsoft continuou a lutar e agora apresenta equipamentos que são topo de gama e lutam pela liderança nos segmentos em que se inserem. Sobretudo pela forte aposta na componente de design, a Microsoft tem sido inúmeras vezes comparada à Apple, a começar pelo minimalismo e pelo requinte das máquinas que tem produzido.
Sem dúvida que a Microsoft assumiu uma abordagem a la Apple para os seus computadores e a marca da maçã é definitivamente a empresa que a gigante de Redmond mais quer enfraquecer. Apresentação após apresentação, os computadores da Microsoft aparecem lado a lado com os da Apple e sempre em comparações onde é superior – segundo a perspetiva da Microsoft, claro.
Até o mercado dos all-in-one, que parece um segmento pouco movimentado e pouco atrativo do ponto de vista do negócio, mas onde reinava o icónico iMac, fez com que a Microsoft arregaçasse as mangas e criasse aquela que é provavelmente a sua máquina obra-prima.
No meio desta guerra toda a Microsoft assumiu que iria lutar de igual para igual com a Apple, incluindo nas margens de lucro dos equipamentos e nos preços que cobraria aos seus consumidores. O Surface nunca foi barato e desde cedo a Microsoft deu a entender que os seus equipamentos vão pertencer todos a um segmento premium e ultra-premium.
Um Surface Pro custa entre 960 euros e 3.150 euros. Um Surface Laptop custa entre 1.170 euros e 2.560 euros. Um Surface Book custa entre 1.650 euros e 3.200 euros. Um Surface Studio custa entre 3.500 euros e 5.000 euros.
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Se há outras marcas que também exercem estes preços – a HP é outra empresa que tem apostado no design, no luxo e no desempenho das suas máquinas, o que traz uma etiqueta avultada -, a Microsoft tem toda a legitimidade em seguir a mesma linha. Em certa medida, os valores acabam por ser justificados pelo bom comportamento dos computadores.
A Microsoft nunca disse que o seu objetivo era colocar um tablet ou um portátil nas mãos de todas as pessoas do mundo. A empresa sempre disse que o objetivo era colocar os melhores tablets e os melhores portáteis nas mãos das pessoas. Está a fazê-lo, sem dúvida.
Mas durante a análise que fizemos ao novo Surface Pro não pudemos deixar de notar alguma vontade extra da Microsoft em ganhar dinheiro. A empresa não só continua a vender um acessório indispensável do Surface Pro à parte – a capa-teclado -, como retirou do pacote básico outro acessório que é obrigatório para ter acesso a toda a experiência Surface – a caneta Surface Pen.
A nova capa-teclado com tecido Alcantara custa 185 euros e a nova Surface Pen custa 115 euros. Estes acessórios que consideramos como indispensáveis na aquisição de um Surface Pro elevam o custo total do equipamento em mais 300 euros. Ou seja, na versão mais básica do Surface o investimento total aumenta 30%, um número que nos parece desadequado.
Quando a Apple apresentou o iPad Pro e logo de seguida o Apple Pencil, não tardaram a chover críticas ao preço de 110 euros do acessório – na altura a Surface Pen custava 70 euros. Qual a resposta da Microsoft? Criar uma nova versão da Surface Pen mais cara. Claro que ambos os acessórios são equipamentos de ponta no seu segmento, mas não deixa de haver oportunismo financeiro em excesso nestas estratégias.
O Surface Studio ainda não está à venda em Portugal, mas quando estiver vai ter também à venda um acessório que ajuda a criar uma experiência única – o Surface Dial vai custar 110 euros, um valor significativo se tivermos em conta que é ‘só’ um acessório.
Numa lógica de consumidor, quem compra equipamentos caros como são estes da Microsoft não deverá ter problema em desembolsar mais umas dezenas de euros para os respetivos acessórios. A questão é que até neste ponto a Microsoft está semelhante à Apple, o que não deixa de ser um posicionamento que pode acarretar os seus riscos.
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Isto porque a concorrência já começou a fazer equipamentos, sobretudo na área do Surface Pro, que são tão bons ou pouco melhores do que a máquina da Microsoft. A diferença é que a concorrência é mais aguerrida no preço e em alguns casos inclui de origem os acessórios pelos quais a Microsoft cobra quantias significativas.
A Apple só não vende mais computadores porque tem um posicionamento premium. A Microsoft, mesmo tendo resultados interessantes em Portugal, a longo prazo acaba por caminhar para este cenário. Sim, durante muito tempo o Surface Pro foi um equipamento único, mas já não é.
Outro exemplo: pelo simples facto de duplicar o armazenamento interno de 512GB para 1TB no Surface Pro a Microsoft pede mais 600 euros. Mesmo reconhecendo que falamos de componentes topo de gama, mais 600 euros pelo dobro do armazenamento é pedir demasiado. A questão é que o Surface Pro foi concebido para ser uma máquina imutável, portanto qualquer atualização manual está fora de questão.
Estes upgrades que saem caros era algo que estávamos habituados a ver há muitos anos na Apple. A marca da maçã mostrou que os consumidores estão dispostos a esquecer esta questão se o produto entregar uma boa proposta de valor. O que temos agora é mais empresas a seguir a mesma estratégia.
Dentro deste universo, a Microsoft é de longe aquela que mais se aproxima da Apple. Para o melhor e para o pior.