Like a Dragon: Infinite Wealth – Análise

Está na altura de o dizer de forma bastante aberta e sem complexos: a malta da Ryu Ga Gotoku Studio é passada da marmita. Porquê? Ora bem, Japão e Havaí, brawler por turnos, Animal Crossing, Crazy Taxi, Pokémon Go, dating sim, Danny Trejo, Street Surfer, karaoke, amizades com golfinhos, homens -coco, gestão de redes sociais, pesca em Mega Drive, cerveja, amor e ódio de novela, cancro, piadas secas, palhaços de andas, megatubarões, shogi, cancelamento e bota abaixo aos EUA.

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Tudo isto está presente num momento ou noutro mais ou menos central da obra, mas há algo que é indesmentível: este é o videojogo mais complexo, atarefado, hilariante, crítico, socialmente que me lembro de jogar nos últimos anos, e para meu gáudio, é um JRPG. Acho eu… Existirão vários sinais de dúvida sobre o que joguei nestas 35 horas e elas vão permanecer em mais 35 que terei de investir ainda, pelo menos.

Leiam então este chorrilho de pensamentos desconjuntados e fiquem ainda com mais perguntas do que respostas sobre Like a Dragon: Infinite Wealth.

Onde comprar:

O passado raramente por lá fica

Ishiban Kasuga. Homem de cabelo espetado e feitio de Golden Retriever. Este é o nosso herói. Mais de metade da sua vida foi passada na prisão devido ao seu código de honra. Não hesita em por-se em perigo até por um desconhecido, o que me deixa enamorado e enervado em doses iguais. É estranho e absurdo, dando o mote para todo o jogo, que partilha estes mesmos adjetivos, mas acrescentando uma vertente de seriedade de temas e situações que não esperava ver por aqui. E tal como um cachorrinho, Like a Dragon: Infinite Wealth e o seu personagem principal têm muita dificuldade em centrar-se no essencial. Será frequente perdermo-nos e será difícil voltar a centrarmo-nos. Mas isso faz parte do caminho de Ishiban para encontrar a sua família desconhecida e descobrir a importância das amizades.

O seu passado definiu-lhe um novo rumo, trabalhando numa empresa de trabalho temporário, ajudando ex-yakuzas a encontrarem novos rumos numa sociedade que os rejeita. Mas esse mesmo passado atraiçoa-o, sendo exposto nas redes sociais pelas suas ligações aos grupos criminosos japoneses. Poderia sentir pena de si próprio, mas o nosso Golden Retriever segue em frente sem rancor.

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Dá por si numa nova terra em busca da mãe que julgava morta e como ponto de luz, atrai até si um conjunto de traças sociais daquele local: um taxista vinculado à máfia, uma estrela das redes sociais com planos maquiavélicos e até Kazuma Kiryu, que volta para um derradeiro capítulo, visto que tem um cancro terminal.

Todos eles gravitam em redor de Ishiban, numa trama que explora a corrupção política num estado americano, o reencontro familiar, o amor e as suas vicissitudes. Tudo o que leva estas personagens a quererem viver.

Mas esta novela policial com pesado envolvimento literário por parte do jogador não foge assim tanto da génese desta saga. O bizarro continua por aqui e tranquiliza-nos. Aqui temos como adversários palhaços gigantes de sorrisos assustadores, anafados, senhores com pizza como escudo e refrigerante como arma, sacos-cama com vida própria, tigres e tubarões. Apesar dos temas densos que são abordados, há sempre um momento que somos recordados que estamos a jogar uma experiência Ryu Ga Gotoku e isso evidencia-se ainda mais quando fugimos da estória principal. Tudo tem o seu tempo aqui, o jogador é que tem de arranjar tempo para o desfrutar na sua aparente plenitude, porque há sempre algo novo e estranho para fazer.

O que é que eu não vou fazer agora?

Entre lutas e avanços e recuos de narrativa, há mesmo muito que fazer em Like a Dragon: Infinite Wealth e tudo é útil. Seja para receber recompensas que podem tornar as batalhas mais acessíveis, como equipamento ou itens e ainda a melhoria dos nossos atributos, aqui tudo o que poderia ser encarado como acessório não o é. Aliás, baseado apenas nestas atividades, consegui evoluir os personagens a níveis que me permitiram não ter que reiniciar demasiadas vezes algumas batalhas mais complexas (aqui não temos ecrã de game over, pagamos algum dinheiro e siga a dança). Existe muito para fazer, mas vou falar apenas de três das atividades onde mais ocupei o meu tempo.

Estão a ver o Crazy Taxi? Claro que estão, quem lê isto jogou certamente este clássico da SEGA! Pois bem, substituam o táxi por uma bicicleta e os passageiros por hambúrgueres e pizzas. Juntem-lhe ainda alguns truques aéreos e um cronómetro e temos o melhor minijogo do ano. Música americanizada mexida, rápidas entregas e um frenesim de ruas para calcorrear em alta velocidade. É super divertido. E recompensador.

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Para quem é mais fã de capturar criaturas para depois combater com as mesmas, temos Sujimon! Depois das batalhas, podemos agora tentar capturar alguns dos delinquentes estranhos que nos aparecem, oferecendo-lhes chocolates e pedinchando para que fiquem convosco. Sim, isto acontece mesmo, tudo à boa maneira japonesa de joelhinhos no chão. Depois de “capturados”, podemos treiná-los para combatermos treinadores avulsos pelo mapa, raids espalhados para tentar arranjar novos Sujimons. Mas o objetivo final é combater numa liga corrupta liderada pelos Discreet Four… Já ouviram falar disto em algum lado? Exato, PalWorld! (cof cof). Os combates lembram até a estrutura do Pokémon Go… É muito divertido.

Para quem prefere algo mais calmo, lá para meio do jogo temos Dondoko Island, um minijogo que possui muitas parecenças a Harvest Moon ou até a Animal Crossing. Com uma narrativa própria, leva-nos a entrar naquela repetição de atividades que temos de completar e que puxa pelo compulsivo-obsessivo dentro de nós: encontrar recursos naturais, desenhar ao pormenor o nosso lar, atrair gente para a nossa ilha paradisíaca… Só neste modo passei algumas doze horas e tenho noção que ficou muito por explorar.


JRPG (Já Receei Pelo Grind), mas afinal não era preciso

Like a Dragon: Infinite Wealth é claramente, no que ao combate diz respeito, uma amálgama de pequenas evoluções que foram acontecendo de título para título. A progressão até um sistema por turnos talvez não fosse o passo em frente que muitos desejariam, embora já experimentado em Yakuza Like a Dragon, mas posso garantir que não é aquele básico “atacas tu, defendo eu” que muitos associam ao género.

Temos diferentes classes em cada aliado, aqui chamadas de profissões e que apresentam diferentes características. Não há magos, mas há magias, há invocações por surfistas, não há poderosos cavaleiros, mas sim membros de ginásio, há ataques contratados por uma porrada de dinheiro de meninas cheias de esteroides.

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O que realmente pode causar estranheza aos mais puristas do género é a capacidade de todas as personagens se poderem movimentar num pequeno raio de ação a cada ataque que se planeia. E é esta pequena alteração que randomiza toda a estratégia de ataque que não seja cuidadosamente planeada. Atacar um inimigo de frente ou por trás tem resultados bastante diferentes, com bónus de proximidade no dano a serem atribuídos; atirar um inimigo para um dos nossos compinchas vai despoletar um ataque seu com mais dano a ser distribuído; esperar pelo momento certo até que os inimigos se alinhem para podermos despoletar um poderoso ataque que os vai afetar a todos. Podemos ainda carregar no momento certo numa tecla predefinida para tornar o nosso ataque mais eficaz ou defendermo-nos de um adversário. E nunca poderíamos esquecer as armas, como bicicletas, cones de trânsito, cadeiras, mesas e tudo o que nos apareça no círculo de combate.

Tudo isto tem mesmo que ser tido em conta, pois as batalhas são duras e alguns dos bosses não perdoam erros ou falta de planeamento. Verdade seja dita que ao deambular pelas cidades, os inimigos estão categorizados por dificuldade e assim sabemos bem com quem devemos ou não metermo-nos, embora o risco seja sempre bem recompensado.

Assim sendo, o grind é real, mas não exaustivo, pois o próprio jogo avisa que devemos estar pelo menos num determinado nível para podermos ter sucesso no progresso, mas nada que uma hora ou duas em diferentes atividades, ou combates não resolva. É grind, sim, mas não parece, tendo em conta que podemos fazer uma panóplia de diferentes coisas para que sejamos fortes o suficiente. É japonês, é por turnos, mas não é o típico JRPG. E ainda bem. E é este o maior elogio que se pode fazer à equipa de produção: mistura bem o equilíbrio entre a estratégia e a interação, dando relevo ao posicionamento em combate, que já era algo determinante nas iterações anteriores quando era apenas um brawler

Considerações finais

Percebo agora que houve imensas coisas de que não falei: por exemplo, o sistema de amizades que constrói uma série de traços de personalidade no nosso herói, bebericando influência à Atlus e aos seus Persona; o karaoke, que sempre teve o seu lugar nestes jogos, de uma diversão imensa; os inúmeros minijogos que brilham tanto pela sua diversidade como originalidade, nenhum deles sendo apenas algo que se cumpre para atingir um objetivo; a música, que tem o seu pináculo em algumas batalhas com bosses, num misto de eletrónica a jingar para o rock pesado… E tenho a certeza que outras particularidades e pormenores me estão a passar ao lado ainda.

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Like a Dragon: Infinite Wealth é um jogo intenso, carregado de emotividade e que exige a vossa atenção por uns dias… 24 horas por dia.

Like a Dragon: Infinite Wealth é um porta-bagagens cheio de cor e bizarria que se abre e nunca mais se quer fechar.


+ Aventura inesgotável de atividades
+ Sistema de combate profundo
+ História épica e emotiva

– Exige tempo e paciência

N.R.: A análise a Like a Dragon: Infinite Wealth foi realizada numa PS5, com o auxílio do acessório Playstation Portal, com uma cópia do jogo gentilmente cedida pela Play&Game.

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Paulo Tavares: Professor de ocupação, jogador por diversão. Guarda religiosamente as cassetes do seu Spectrum 128k. Leva demasiado a sério a discussão de melhor Final Fantasy. 7, fim de conversa.
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