Seis anos depois do lançamento do jogo de estreia da saga Life is Strange (homónimo ao nome da própria saga), chega-nos, pela mão da Deck Nine, Life is Strange: True Colors, cuja única similaridade às duas entradas anteriores será a da existência de um protagonista com, bem, poderes algo fora do vulgar. Aqui, seguimos a história de Alex Cheng, uma jovem de 21 anos, recém-chegada à idílica cidade de Haven Springs, Colorado, com apenas uma grande mochila e um segredo um tanto ou quanto maior que a sua bagagem às costas.
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A viagem começa aqui: Alex reencontra-se novamente com o seu irmão perdido, Gabe, após terem sido separados pelo sistema de adopções norte-americano onze anos antes. Isto significa que Alex pode finalmente ser aquilo que, logo ao início do jogo, ambiciona ser: “just a normal girl in a normal town“. Mas será que será assim tão simples?
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Querido Diário,
Ao longo dos seus anos ao cuidado de instituições, a nossa protagonista desenvolveu o poder de conseguir não só sentir, como também de compreender as emoções de quem a rodeia. Empatia sobrenatural, chamemos-lhe. Estas emoções são-lhe transmitidas por cores: a aura da pessoa ilumina-se de determinada cor (correspondente à da emoção sentida). Porém, caso esta seja de uma intensidade imensurável, Alex passa não só a sentir e compreender, como também a experienciar essa mesma emoção em primeira mão. Como, infelizmente, a sua vivência não foi fácil, Alex também se vê numa encruzilhada de sentimentos aos quais não consegue fugir, como episódios depressivos ou ataques de raiva que lhe fogem ao controlo.
E, assim, Alex começa um novo capítulo. Quando a tragédia abate na pacata cidade, torna-se imperativo manter a paz e a nossa protagonista vê-se obrigada a proteger-se a si própria tanto quanto a sua nova casa. A maior parte do tempo, Life is Strange: True Colors funciona exactamente do mesmo modo que os jogos anteriores: é possível vaguear pelas ruas, entrar nas lojas, interagir com alguns objectos, ou, simplesmente, ouvir Alex a expressar um pensamento sobre eles. Ao interagir com alguns dos habitantes (ou até objectos, em alguns casos), o jogo faz com que as nossas escolhas de diálogo sejam impactantes no nosso futuro; pelo que estas afectarão não só o final, como também o decorrer da história que vamos folheando.
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A forma como Life is Strange: True Colors pauta os momentos mais duros a nível emocional é coesa, apesar de Haven Springs e os seus moradores terem uma base de simpatia, daquela confortável e calmante, que quase nos faz esquecer do mau que a vida pode trazer. Isto faz com que, como Alex, sintamos que nos tiram o tapete de debaixo dos pés por vezes, ao invés de termos ondas de tristeza e desespero constantemente a cair sobre nós. Ainda assim, existe sempre uma linha condutora algo soturna mais discreta, abordando tópicos como morte, doença, dor, amizades, parentalidade, e qual o preço a pagar por empatizar ou perdoar os monstros que vivem debaixo da nossa cama.
Não há lugar como casa
Haven Springs parece saída de um postal; aquele local que todos queremos visitar, mas que não dá (porque não existe, na verdade). Os cenários serão, certamente, os mais visualmente apelativos até agora na série: desde o detalhe presente nas construções, às montanhas de cortar a respiração. A vontade é a de explorar todos os cantos e recantos, à procura de mais objectos ou NPC’s com que interagir, apenas para poder apreciar o que nos rodeia — o jogo até nos incentiva a isso. Existe uma história escondida pelo bairro que nos rodeia, se nos dermos ao trabalho de a procurar.
Life is Strange: True Colors é muito mais movido pelos participantes da história do que os seus antecessores. Sim, as escolhas continuam a ser feitas por nós e, por vezes, pode parecer que a escolha de diálogo que estamos a tomar não terá impacto, quando, na verdade, tem. Diria até que seriam as escolhas menos óbvias; portanto, o que nos pode parecer ideal na altura, pode ser algo de que nos arrependeremos mais tarde.
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Outro aspecto de caracterização inexistente nos jogos anteriores, é a falta de uma linha romântica demarcada para uma personagem específica. Aqui, Alex pode ter um de dois interesses românticos: Steph ou Ryan. Existe, efetivamente, um momento no qual podemos afirmar se estarmos interessados em mulheres, homens, ou ambos. Ou nenhum, na verdade, pois não somos obrigados pela storyline principal a ter de ir por essa via; é somente um subplot. A existência dele, no entanto, é importante.
Existe um momento, em particular, em que vemos Alex a lançar uma garrafa contra uma parede. O momento em si não é chocante, mas o facto de vermos, num jogo, uma mulher a fazê-lo, a expressar-se, pode sê-lo. Por norma, quando existe uma personagem feminina a manifestar as suas emoções de uma forma tão efusiva, são adjectivadas como “demasiado emocionais” ou “complicadas”. Aqui, torna-se num murro no estômago emocional, pois vemos a personagem principal a conseguir largar toda a sua frustração e raiva contra as cruéis circunstâncias em que se encontra, e, isso sim, é de partir o coração. Life is Strange: True Colors é cheio de momentos como estes: uma jovem mulher queer pode chorar, berrar e ser feliz, livre de vergonha — o que é algo de muito especial.
Considerações Finais
Life is Strange: True Colors é um jogo magnífico, com um final satisfatório tanto para o plot principal, como para a viagem pessoal que Alex atravessa.
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É uma experiência que prioriza qualidade a quantidade, que prefere trazer ao de cima sentimentos ao invés de detalhes mais afinados, e um sentido à própria série; tal como Alex, que regressa às suas raízes, após um período de ausência e de mudança. Porém, há uma coisa que nunca irá mudar: continuam sem saber dançar.
N.R.: A análise a Life is Strange: True Colors foi realizada numa PlayStation 5 com acesso a uma cópia do jogo gentilmente cedida pela Play & Game.