Análise Balan Wonderworld

Para desgosto de muitos jogadores, o género das plataformas nas três dimensões caiu em desuso na altura em que a sétima geração de consolas arrancou. Exceptuando um certo ícone italiano e um ou outro título esporádico, este estilo de jogo revelava-se, até há pouco tempo, tão comum quanto água no deserto, obrigando os fãs a desenterrar consolas antigas para experienciar um género tão em voga nos anos 90 e início de milénio. Nos últimos tempos, essa tendência tem vindo a reverter-se e quem melhor para entrar na onda de revivalismo que Yuji Naka, um dos principais responsáveis por Sonic the Hedgehog, Nights into Dreams e Phantasy Star. Numa primeira impressão, Balan Wonderworld parece ter-se materializado nos estúdios de uma Sega dos anos noventa que encontrou uma anomalia temporal e trouxe até ao presente um sucessor espiritual de Nights into Dreams.

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O traço característico de Naoto Oshima nas personagens é o suficiente para reforçar essa percepção. Infelizmente, o resultado da conciliação de esforços entre Square Enix, Arzest e Balan Company renega para o limbo as lições, os aperfeiçoamentos e inovações que os melhores títulos do género foram introduzindo ao longo das gerações.

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Balan Wonderworld, tal como o próprio nome indica, apresenta o mundo mágico de Balan, um excêntrico maestro, que para além de se assemelhar a um primo de Nights, é o anfitrião do teatro musical que dá vida aos conflitos interiores das personagens. A aventura inicia-se ao escolherem entre Leo Craig e Emma Cole, as duas crianças que ajudarão uma panóplia de personalidades a restaurar os seus corações no mundo mágico do teatro, onde memórias e realidade se cruzam.

A história, talvez devido à natureza psíquica em que opera, não é sempre clara nas motivações dos intervenientes e nem sempre existe uma lógica congruente das suas ações. No entanto, as cinemáticas são na sua maioria eficazes ao transmitir temas sensíveis relacionados com a condição humana. Temas como frustração pelo falhanço constante, bloqueio criativo e perdas familiares podem ascender à tona sentimentos destrutivos e no jogo esses demónios interiores emergem através da metamorfose das personagens em monstros. A direção artística de algumas das cinemáticas é fantástica.

Transição atribulada do papel ao ecrã

É no momento em que pegam no comando que Balan Wonderworld descarrila, ao afastar-se da magia embutida nas cutscenes. Começam na Isle of Tims, o hub que vos dá acesso aos doze capítulos da campanha. Cada capítulo alberga dois níveis e um boss. Os Tims são pequenas criaturas de diversas cores e alimentam-se de cristais que o jogador coleciona pelos níveis. Dependendo da cor, eles poderão ajudar-vos contra os inimigos e a encontrar itens mas a sua utilidade acaba por se tornar irrelevante, acentuando uma das tendências de Balan Wonderworld: a insistência na quantidade e superficialidade ao invés da qualidade e substância.

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Os oitenta fatos disponíveis representam bem essa filosofia da produtora. Numa decisão bizarra, cada fato possui apenas uma habilidade, incluindo o salto e existe unicamente um botão de ação. Significa que um fato que dispare um projétil será incapaz de saltar e vice-versa. Há fatos que permitem planar, disparar, deslizar no gelo ou iluminar zonas escuras. As funções da maior parte dos fatos acabam por se assemelhar ao fim de algum tempo e muitos deles tornam-se obsoletos. A produtora podia ter condensado os oitenta fatos em menos de um quarto e atribuído algumas das habilidades aos restantes botões e o jogo tornar-se-ia menos confuso e evitaria um backtracking completamente desnecessário.

Todavia, nem tal alteração tornaria Balan wonderworld num bom jogo, uma vez que o design de níveis é simplesmente atroz. Sempre que as habilidades são requeridas, nunca passam de uma ação rudimentar, arcaica mesmo. De novo, a produtora preocupou-se mais em adicionar um número ridículo de mecânicas básicas só porque sim, em vez de as desenvolver num conjunto de obstáculos e plataformas estimulantes e desafiantes, como Mario e Astrobot fazem tão bem.

Uma peça de teatro sem brilho

O sistema de progressão, que consiste em recolher certo número de estatuetas de Balan para desbloquear os níveis seguintes, é emprestado dos clássicos das plataformas, embora como já foi referido, se apoie por demasia em backtracking. O regresso a níveis anteriores não seria tão problemático caso não tivessem que gerir uma multidão de fatos, pois apenas podem carregar três deles em simultâneo.

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Em relação às batalhas de boss, estas revelam-se previsíveis, bastando três ataques para os arrumar mas são ligeiramente melhores que os níveis. Os controlos são desajeitados, a personagem sente-se desenquadrada no mundo e recorrentemente a maior inimiga será a câmara. Balan Wonderworld  presta ode, não apenas ao conceito, mas também às limitações de design e câmara, com especial evidência nos jogos de plataformas da era PS1 e N64. Encontrarão algum divertimento a espaços mas a esmagadora maioria do tempo será passado a questionarem-se como é que em pleno 2021 é lançado um jogo de plataformas AAA tão desinspirado.

Apesar da versão testada ter sido na PS5 e contar com os caprichos de 4K e 60FPS, o grafismo oscila entre momentos bonitos e outros datados. Sendo que os níveis se passam na mente de diversas personagens, é interessante observar o seu mundo interior. Um dos níveis que se destacaram passa-se num mundo aquático, em que um enorme golfinho se estende pelo céu e as águas correm límpidas. Mas se alguns dos níveis são bonitos, as animações revelam-se fracas, em especial na movimentação do protagonista. O destaque a nível estético vai sem dúvida para as cinemáticas, cortesia da Visual works.
As melodias têm o seu encanto, e apesar de umas serem melhores que outras, são bem-sucedidas na transmissão de um ambiente festivo e de animação. O tema principal ficou incrível, embora seja utilizado com menor frequência.

Considerações Finais

Os jogos de plataformas em 3D são um dos géneros mais saudosos, em especial para quem cresceu nos anos noventa, tendo a infância definida por Crash Bandicoot, Banjo Kazooie e Super Mario 64. A proposta de Balan Wonderworld passa por pegar na estrutura dessas obras e embrenhá-las com o encanto da Sega desse mesmo período.

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O resultado é um jogo que absorveu as características primitivas do género, como design de níveis arcaico e básico, câmara inconsistente e uma falta de polimento e equilíbrio de mecânicas. A lenda Yuji Naka regressou já sem a pujança de outrora, o que nos impossibilita a recomendação deste título.


+ Balan é uma personagem carismática
+ As cinemáticas são de qualidade
+ Banda sonora animada

– Níveis básicos e aborrecidos
– Câmara inconsistente
– Animações pobres
– Demasiados fatos de utilidade duvidosa e que tornam o processo de utilização artificialmente complicado

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N.R.: A análise a Balan Wonderworld foi realizada numa Playstation 5 com acesso a uma cópia do jogo, gentilmente disponibilizada pela Play & Game.

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